terça-feira, 2 de outubro de 2012

CRIMES NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR




FUNCIONALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL E OS CRIMES NA RELAÇÃO DE CONSUMO
Mariayda Faria


As  normas penais incriminadoras são eficazes na prevenção do abuso do poder econômico no caso das relações de consumo. Tais crimes estão elencados no art. 63 e seguintes do Código de Defesa do Consumidor.

Art. 63: Omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos, nas embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade:
Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa. §1o Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante recomendações escritas ostensivas, sobre a periculosidade do serviço a ser prestado.
§2o Se o crime é culposo: Pena – Detenção de um a seis meses ou multa

Este artigo procura reforçar o mandamento do artigo 9º do mesmo Código, pois este exige dos fornecedores de produtos e serviços a obrigação de informar nos rótulos e mensagens publicitárias, de maneira clara, os aspectos de nocividade e periculosidade do produto ou serviço que podem colocar em risco a saúde ou segurança do consumidor.

A classificação é a seguinte:

Crime Comum (quanto a legislação), próprio (quanto ao sujeito ativo), de perigo abstrato (quanto a lesão do bem jurídico tutelado), de mera conduta (quanto ao resultado), omissivo próprio (quanto a ação), principal (quanto a exigibilidade de consumação de outro crime), unissubsistente (quanto ao fracionamento do iter criminis), unissubjetivo (quanto ao número de sujeitos ativos), doloso ou culposo (quanto ao elemento subjetivo), de ação única (quanto ao núcleo do tipo), de ação penal pública incondicionada (quanto à ação penal) e instantâneo (quanto a duração) PASSARELLI, Eliana. Dos crimes contra as relações de consumo: Lei federal no 8.078/90 (CDC). São Paulo: Saraiva, 2002.

De acordo com o art. 18, parágrafo único, do Código Penal, que positivou o princípio da excepcionalidade, a figura culposa será admitida apenas quando expressamente prevista no texto legal. Na Lei federal n. 8.078/90,o legislador optou por criminalizar as condutas tipificadas no art. 63, § § 1º e 2º, quando o elemento subjetivo do agente for a culpa stricto sensu.

O artigo 64 assim dispõe:

Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado:
Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa. Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo (PASSARELLI, 2002, p. 55).

Tal artigo procura preservar os valores dispostos no inciso I do artigo 6o do CDC[1]. Além de apenar o sujeito ativo com penas de detenção e pecuniária, “visa assegurar o cumprimento do dever de o fornecedor ‘fazer
boa a coisa vendida’” (FILOMENO, 2000, p. 619). O referido texto, trata dos produtos que têm sua nocividade ou periculosidade conhecidas apenas após sua distribuição no mercado, e punirá o fornecedor que, tomando conhecimento do fato, não comunicar a autoridade competente e os consumidores sobre a descoberta.

Será ainda apenado nos termos desse artigo quem deixar de tirar do mercado
os produtos nocivos ou perigosos, quando determinado pela autoridade competente, conforme o parágrafo único do artigo em testilha.

Sua classificação doutrinária é a seguinte: é um delito comum, próprio, de perigo, de mera conduta, comissivo, principal, simples, plurissubsistente, unissubjetivo, doloso, de ação única e instantânea. É admitida a tentativa, pois como vimos, trata-se de crime comissivo e plurissubsistente. Mais uma vez a sanção cominada é cumulativa.

O objeto jurídico tutelado é o direito do consumidor de ter sua vida, saúde e
segurança protegidas. O sujeito ativo é qualquer prestador de serviço que contrariar determinação de autoridade competente na execução do serviço perigoso. Os sujeitos passivos por sua vez são a coletividade, os consumidores difusamente considerados e o exposto diretamente ao serviço perigoso prestado.

Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.
§1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.
§ 2º Se o crime é culposo;
Pena Detenção de um a seis meses ou multa (PASSARELLI, 2002, p. 67-68).

Proteger o direito do consumidor à informação clara e não contraditória, que lhe é inerente, e que estão dispostas no artigo 30 e seguintes do Código de Defesa do Consumidor.

O sujeito ativo é qualquer fornecedor que ofereça produtos ou serviços em desconformidade com o artigo, ou quem patrocine a oferta fraudulenta ludibriando ou não informando o consumidor. O elemento subjetivo do tipo é “o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de fazer a afirmação falsa ou enganosa, omitir informação relevante ou patrocinar oferta sabendo-a fraudulenta. Embora prevista em lei, há controvérsia quanto a modalidade culposa” ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1993.

Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa. Parágrafo único – Vetado – Incorrerá nas mesmas penas quem fizer ou promover publicidade de modo que dificulte sua identificação imediata (BRASIL, 1990).

O crime possui duas objetividades jurídicas. Uma é tutelar as relações de consumo, e a outra é proteger a integridade psíquica de todos os consumidores. Esse artigo, ao contrário do anterior, trata-se de crime de dano, pois se exige lesão do bem
jurídico tutelado, não bastando apenas o perigo.

Os sujeitos ativos são os profissionais que criam e produzem publicidade (publicitários) e os responsáveis pelo meio de veiculação dessa publicidade. Os sujeitos passivos são os consumidores difusamente considerados e os expostos diretamente a publicidade. Os elementos subjetivos do tipo são dois: o dolo (sabe) e a culpa (deveria saber).

Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança:
Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa: Parágrafo único – Vetado – Incorrerá nas mesmas penas quem fizer ou promover publicidade sabendo-se incapaz de atender à demanda .

Como se trata de um delito que cuida diretamente da vida e segurança do consumidor, o legislador cominou  uma pena que é duas vezes maior que a do artigo anterior, que trata tão-somente de uma lesão que não seja prejudicial à vida ou segurança do consumidor.

A propaganda terá que induzir o comportamento do consumidor de tal maneira que coloque em risco a sua saúde ou segurança, esse risco não for observado, e houver publicidade abusiva ou enganosa.

No que diz respeito à objetividade jurídica, temos duas proteções: a primeira protege a relação de consumo, e a segunda protege a saúde e segurança dos consumidores.

Há mais de um sujeito ativo para este delito: um é quem faz a publicidade
(publicitário) e outro é quem veicula propaganda que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a ter um comportamento prejudicial ou perigoso a sua saúde ou segurança. Já os sujeitos passivos são todos os consumidores difusamente considerados e aquele no qual a publicidade seja capaz de induzi-lo a ter um comportamento prejudicial ou perigoso a sua saúde. Os elementos subjetivos do tipo são dois: o primeiro é dolo direito ou eventual (sabe), e o segundo é a culpa (deveria saber).

Art. 69. Deixar de organizar dados fáticos, técnicos e científicos que dão base à publicidade:
Pena Detenção de um a seis meses ou multa.

Este artigo, em sua tipificação, pune quem não organiza dados fáticos, técnicos,
e científicos que dão base à publicidade.

Como sujeito ativo temos o fornecedor, e como sujeito passivo encontramos a coletividade de consumidores. Trata-se de crime omissivo próprio, caracterizado pelo núcleo do tipo “deixar”. Como elemento subjetivo do tipo, temos o dolo. Inexiste punição a título de culpa.

Art. 70. Empregar na reparação de produtos, peça ou componentes de reposição usados, sem autorização do consumidor: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa (BRASIL, 1990).

Esse crime é classificado como comum, próprio, de perigo, de mera conduta, comissivo, principal, simples, unissubsistente, unissubjetivo, doloso, de ação única e instantâneo. O sujeito ativo deste delito é o fornecedor de serviços. O sujeito passivo é a coletividade de consumidores. Podemos ainda destacar que o crime possui dúbia objetividade jurídica, que são as seguintes: a proteção à tutela das relações de consumo e o patrimônio do consumidor lesado.

Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.

Com a tipificação, será punido cumulativamente com detenção e multa, o fornece-dor (sujeito ativo)1 que se valer de ameaça, coação, constrangimento físico ou mo-ral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas, ou qualquer outro meio que exponha o consumidor (sujeito passivo juntamente com a coletividade) ao ridículo, ou que interfira no seu trabalho, descanso ou lazer, para que assim sejacobrado e impelido a pagar a dívida.

No artigo 42, que diz o seguinte,

 Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais,salvo hipótese de engano justificável.

Temos como objetividade jurídica primeira, a relação de consumo. Secundaria-mente se protege a honra, a incolumidade física e psíquica do consumidor lesado. Já a classificação que se dá a esse crime é a seguinte: é crime comum, próprio, de perigo, de mera conduta ou material, comissivo, principal, simples, unissubsistente,
plurissubsistente, unissubjetivo, doloso, de ação múltipla e instantâneo. “Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros: Pena - Detenção de seis meses a um ano ou multa”.

Esse artigo procura através de sua tipificação penal proteger o que já consagra
o mesmo Código no artigo 43, parágrafos 1o e 2o, que diz o seguinte:

Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
 § 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos.
 § 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.

O artigo 73 é uma forma de desdobramento do anterior. Castiga-se aqui, o fornecedor ou qualquer pessoa que seja responsável (sujeito ativo) e que não corrigir imediatamente informação sobre consumidor difusamente considerado (sujeito passivo) que conste em cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber não estar correto. Pune-se apenas com uma sanção, que pode ser de detenção ou multa.

Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser inexata:
Pena - Detenção de um a seis meses ou multa.

A tipificação em questão no referido artigo 73 visa proteger as relações de consumo e a dignidade do consumidor diante da proteção ao crédito. A classificação desse crime é a seguinte: é crime comum, próprio, de perigo, de mera conduta, omissivo
próprio, principal, simples, unissubsistente, unissubjetivo, doloso, de ação única e instantânea.

“Art. 74: “Deixar de entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente preenchido e com especificação clara de seu conteúdo; Pena - Detenção de um a seis meses ou multa”

Pune-se quem deixar de entregar (sujeito ativo) ao consumidor (sujeito passivo junto com a coletividade) o termo de garantia adequadamente preenchido com indicação clara do conteúdo. Tido como crime comum, próprio, de perigo, de mera conduta, omissivo próprio, principal, simples, unissubjetivo, doloso, de conteúdo variado e instantâneo.

Data de Publicação: 23/09/2012
Ementa: REGISTRO DE CANDIDATURA VEREADOR IMPUGNAÇÃO CRIME CONTRA O DIREITO DO CONSUMIDOR CONDENAÇÃO CRIMINAL ART. 15 , III , DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO EENQUANTO DURAREM OS SEUS EFEITOS DESPROVIMENTO.. agind2012t REGISTRO DE CANDIDATURA VEREADOR IMPUGNAÇÃO CRIME CONTRA O DIREITO DO CONSUMIDOR CONDENAÇÃO CRIMINAL ART. 15 , III , DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO DA...

TJSP -  Recurso em Sentido Estrito RECSENSES 9000008212010826 SP...

Data de Publicação: 10/08/2012
Ementa: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA OFERTADA POR CRIME CONTRA O CONSUMIDOR. GERENTE DE PLANTÃO É, EM TESE, RESPONSÁVEL PELA ADULTERAÇÃO DO PRAZO DE VALIDADE DOS PRODUTOS COLOCADOS À VENDA MESMO QUE NÃO PARTICIPE DIRETAMENTE NA FRAUDE. RECURSO PROVIDO PARA O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA OFERTADA CONTRA ELE.


Súmulas do STJ:


1  
Súmula 479
(SÚMULA)
As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos
gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados
por terceiros no âmbito de operações bancárias.
DJe 01/08/2012

2  
Súmula 477
(SÚMULA)
A decadência do art. 26 do CDC não é aplicável à prestação de
contas para obter esclarecimentos sobre cobrança de taxas,
tarifas e encargos bancários.
DJe 19/06/2012
RSTJ vol. 226 p. 868

3  
Súmula 473
(SÚMULA)
O mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro
habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante
ou com a seguradora por ela indicada.
DJe 19/06/2012
RSTJ vol. 226 p. 864

4  
Súmula 469
(SÚMULA)
Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano
de saúde.
DJe 06/12/2010
RSTJ vol. 220 p. 727

5  
Súmula 404
(SÚMULA)
É dispensável o aviso de recebimento (AR) na carta de comunicação
ao
consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos de dados
e cadastros.
DJe 24/11/2009
RSTJ vol. 216 p. 759

6  
Súmula 385
(SÚMULA)
Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe
indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição,
ressalvado o direito ao cancelamento.
DJe 08/06/2009
RSTJ vol. 214 p. 541

7  
Súmula 381
(SÚMULA)
Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício,
da abusividade das cláusulas.
DJe 05/05/2009
RSTJ vol. 214 p. 537

8  
Súmula 359
(SÚMULA)
Cabe ao órgão mantenedor do Cadastro de Proteção ao Crédito a
notificação do devedor antes de proceder à inscrição.
DJe 08/09/2008
RSTJ vol. 211 p. 548

9  
Súmula 321
(SÚMULA)
O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica
entre a entidade de previdência privada e seus participantes.
DJ 05/12/2005 p. 410
RDDP vol. 35 p. 232
RSSTJ vol. 26 p. 275
RSTJ vol. 198 p. 630

10  
Súmula 302
(SÚMULA)
É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no
tempo a internação hospitalar do segurado.
DJ 22/11/2004 p. 425
RSSTJ vol. 24 p. 11
RSTJ vol. 183 p. 625
RSTJ vol. 185 p. 671


11  
Súmula 297
(SÚMULA)
O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições
financeiras.
DJ 09/09/2004 p. 149
RSSTJ vol. 23 p. 243
RSTJ vol. 185 p. 666

12  
Súmula 285
(SÚMULA)
Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do
Consumidor incide a multa moratória nele prevista.
DJ 13/05/2004 p. 201
RSSTJ vol. 21 p. 421
RSTJ vol. 177 p. 157
RT vol. 824 p. 151

13  
Súmula 284
(SÚMULA)
A purga da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é
permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do
valor financiado.
DJ 13/05/2004 p. 201
RSSTJ vol. 21 p. 387
RSTJ vol. 177 p. 125
RT vol. 824 p. 151



[1] Este dispositivo é um tipo penal aberto, pois caberá ao aplicador e intérprete
dar o significado de nocividade e periculosidade. Este crime é omissivo próprio, e a conduta só será punida quando for dolosa. A pena, mais uma vez, é cumulativa.